Reparar o Menisco: Entre a Técnica, a Evidência e a Sustentabilidade.

Nos últimos anos, o cuidado com o menisco passou a ocupar um novo patamar de prioridade na ortopedia esportiva. O que antes era uma decisão técnica restrita à sala cirúrgica, hoje se tornou também uma questão estratégica para os sistemas de saúde.


Nos Estados Unidos, o mercado de tratamento de lesões meniscais deve atingir US$479,38 milhões até 2033, segundo a Astute Analytica (2024). Esse crescimento é impulsionado pela ampliação da prática esportiva, envelhecimento populacional e, principalmente, pela adoção de técnicas minimamente invasivas como a sutura meniscal all-inside, que atualmente representa quase 50% das intervenções realizadas. A preferência se justifica por uma combinação poderosa: segurança clínica, menor tempo operatório e desfechos funcionais preservados.


Mas por que essa tendência global deveria interessar à saúde suplementar brasileira?


Porque ela nos convida a rever o modo como avaliamos a relação entre custo e benefício em intervenções ortopédicas.


Um estudo publicado no periódico Knee (Vint et al., 2021) comparou diretamente as técnicas all-inside e inside-out. A meta-análise revelou que a técnica all-inside oferece redução significativa no tempo cirúrgico e 85% menos risco de lesão nervosa — sem comprometer a taxa de cicatrização meniscal nem os desfechos funcionais dos pacientes.


Já o trabalho de Petersen et al. (2022), no Archives of Orthopaedic and Trauma Surgery, foi além: ao analisar o seguimento clínico acima de 7 anos, mostrou que as taxas de falha são baixas em adultos, as alterações degenerativas são discretas e os escores funcionais se mantêm bons a excelentes. Isso inclui casos em que o reparo foi associado à reconstrução do ligamento cruzado anterior (LCA), reforçando a robustez da estratégia.


O que isso significa? Que reparar o menisco preserva a cartilagem, reduz o risco de artrose e posterga (ou evita) a necessidade de artroplastias. Em outras palavras: é um investimento com retorno clínico e sistêmico.


Mas e o custo?

È  legítimo o argumento de que técnicas como a all-inside têm custo inicial mais elevado. Entretanto, a análise econômica deve ir além do material utilizado. Os dados do estudo do IPEA (2014) revelam que, mesmo com reajustes médios acima da inflação, o setor de saúde suplementar brasileiro convive com alta sinistralidade (acima de 80%), margens líquidas estreitas e forte dependência de receitas financeiras para manter a rentabilidade.


Nesse cenário, estratégias que evitam reoperações, limitam afastamentos prolongados e adiam a degeneração articular são mais do que desejáveis — são necessárias.


Deixar de reparar um menisco por economia imediata, para depois arcar com artroses precoces, infiltrações recorrentes ou próteses precoces, é uma equação insustentável. A escolha pela técnica cirúrgica deve considerar valor agregado à saúde do paciente ao longo do tempo, e não apenas o custo isolado do procedimento.


Conclusão:

Reparar o menisco é uma escolha técnica, sim — mas também é uma decisão política e econômica. Exige confiança na evidência científica, visão de longo prazo e coragem para adotar práticas que desafiam o raciocínio meramente contábil. Operadoras de saúde, reguladores e profissionais devem convergir para um modelo que valorize resultados duradouros, função preservada e sustentabilidade do sistema.


O futuro da ortopedia — e da saúde suplementar — passa por decisões como essa.


Referências:


 [US Meniscus Treatment Market – Astute Analytica](https://www.globenewswire.com/news-release/2024/12/23/3001070/0/en/US-Meniscus-Treatment-Market-to-Hit-Valuation-of-US-479-38-Million-By-2033-Astute-Analytica.html)

 Vint H. et al. All-inside vs. inside-out meniscal repair. Knee. 2021. [DOI: 10.1016/j.knee.2020.12.005](https://doi.org/10.1016/j.knee.2020.12.005)

 Petersen W. et al. Long-term results after meniscus repair. Arch Orthop Trauma Surg. 2022. [DOI: 10.1007/s00402-021-03906-z](https://doi.org/10.1007/s00402-021-03906-z)

 Leal, R.M. O mercado de saúde suplementar no Brasil: regulação e resultados econômicos. IPEA, 2014.


Leonardo Addeo Ramos